Artigo publicado no blogue Somos Livros, da Bertrand Livreiros, a 19 de dezembro de 2020.
Para Manoel de Barros, um dos mais aclamados poetas brasileiros de sempre, a poesia era uma “voz de fazer nascimentos”. Apesar de ter escrito o seu primeiro livro de poemas aos 19 anos de idade Poemas Concebidos sem Pecado), só ficou conhecido aos 64, quando Millôr Fernandes o descobriu e divulgou. A partir daí, levaria a literatura brasileira a atravessar o oceano, valendo-lhe a comparação a Guimarães Rosa, enquanto figura de proa do panorama literário do seu país. Apesar de ter sido com a poesia em prosa de Arthur Rimbaud que aprendeu que podia misturar todos os sentidos, os seus verdadeiros mestres foram as crianças e a natureza, a quem dedicou grande parte dos seus poemas.
Admirado pelos seus contemporâneos – Carlos Drummond de Andrade recusou o epíteto de maior poeta vivo do Brasil a favor de Manoel de Barros -, continua a ter uma influência tremenda em autores contemporâneos de diversas nacionalidades. O autor angolano Ondjaki, no prefácio do seu livro Há Prendisajens com o Xão, escreve que foi Manoel de Barros quem lhe ensinou a importância do chão (em referência ao poema O apanhador de desperdícios: “Não gosto das palavras fatigadas de informar. Dou mais respeito/às que vivem de barriga no chão/tipo água pedra sapo”). Já o moçambicano Mia Couto, no poema Um abraço para Manoel, reconhece como o poeta brasileiro lhe ensinou uma “sabedora desgeografia”.
No dia em que celebramos 104 anos desde o seu nascimento, recordamos Manoel, o poeta, “fazedor de frases” e “apanhador de desperdícios”.
Poesia não é para compreender mas para incorporar
Entender é parede: procure ser árvore.